Duo Nazario | História

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Uma vida de parceria

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Formado pelo compositor e pianista Lelo Nazario e pelo baterista e percussionista Zé Eduardo Nazario, o Duo Nazario explora uma formação incomum – teclados e bateria – para conectar música contemporânea e recursos eletrônicos aos ritmos tradicionais afro-brasileiros. “Experimentar múltiplas possibilidades de encontro entre linguagens e universos musicais com total liberdade criativa é o principal conceito de trabalho do Duo”, explica Lelo.

A trajetória musical dos irmãos Lelo e Zé Eduardo se entrelaça ao longo de quatro décadas. Seu pai, o jornalista
Joaquim Pinto Nazario, era diretor dos Diários Associados, um dos maiores impérios da imprensa brasileira fundado por Assis Chateaubriand que, nos anos de 1960, reunia dezenas de emissoras de rádio e de televisão, jornais e revistas. Na época, a casa da família no bairro de Vila Mariana, em São Paulo, era frequentada por jornalistas, intelectuais e músicos que ouviam jazz e bossa nova e criavam um ambiente cultural rico que iria marcar a carreira dos irmãos.

Desde cedo, os dois estudaram piano e bateria. Zé Eduardo, mais velho, já aos 13 anos era músico profissional, tocando bateria, que ganhara dos pais, ao lado de importantes artistas do cenário musical paulistano. Lelo era fascinado pela música erudita contemporânea, sobretudo as inovações de compositores como Stockhausen, Messiaen e Berio. Logo, aperfeiçou-se no piano e, usando um gravador de rolo Wollensak que o pai trouxera de Nova York, começou a fazer experimentações eletroacústicas. Ainda adolescente, passou a compor inspirado nessa música nova e no jazz moderno.
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No início da década de 1970, os irmãos passaram a praticar juntos, explorando uma música mais livre, experimentando formas diferentes e aprofundando uma afinidade musical rara. Em 1973, Zé Eduardo, então com 21 anos, foi convidado para tocar com Hermeto Pascoal, que, mais tarde, também levou Lelo, com 17, para integrar a sua banda. Logo depois, em 1974, os irmãos formaram o Malika, junto com Hector Costita e outros músicos, conjunto que procurou criar um som original juntando folclore sul-americano, música eletrônica, free jazz e percussão.

Os Nazario permaneceram com Hermeto até 1977. Nos intervalos dos ensaios com a banda, costumavam tocar as próprias músicas, só os dois, por horas. Às vezes, Hermeto se juntava ao duo com o sax soprano e faziam uma música livre. Embora ainda bem jovens, Lelo e Zé Eduardo já acumulavam um grande entendimento das linguagens contemporâneas, uma experiência única e uma sintonia fina. A integração entre eles vinha da prática diária de tocar e experimentar juntos, que os irmãos adquiriram desde meninos e que os ajudou a desenvolver uma forma de expressão muito particular.

Assim, logo começaram a criar uma linguagem própria, diferente da que era desenvolvida no grupo de Hermeto. “Naquela época, tanto a linguagem da música eletrônica e eletroacústica quanto o uso da percussão de ponta já nos eram habituais, de forma que todas as composições e arranjos possuíam uma identidade própria”, conta Zé Eduardo. Foi a partir desse trabalho experimental que os irmãos criaram o Grupo Um em 1976.

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Considerado o mais fecundo e ousado núcleo de criação da vanguarda paulista surgida em torno do Teatro Lira Paulistana, o Grupo Um trazia uma música nova, em que as harmonias avançadas de Lelo se somavam à rítmica moderna de Zé Eduardo. “A linguagem aberta e contemporânea sempre foi utilizada no Grupo Um”, recorda o baterista. “A música do grupo é música brasileira do tempo presente, multidimensional e transformadora”, diz o pianista, que assinou a maioria das composições. Com o Grupo, que atuou até 1984, Lelo e Zé Eduardo lançaram três álbuns e levaram a música brasileira a patamares de virtuosismo e inventividade até hoje inigualáveis.

A música de vanguarda do Grupo Um foi recebida com entusiasmo pela crítica e pelo público, projetando os jovens num plano de destaque da música brasileira. Zé Eduardo foi aclamado como baterista de grande talento e energia, entre os melhores do instrumento, enquanto Lelo foi reconhecido como pianista de grande virtuosismo e compositor de concepção arrojada e imaginação requintada. Após o encerramento das atividades do grupo, os irmãos retomaram suas carreiras individuais, porém, seus caminhos iriam se cruzar novamente no projeto do Duo.
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Após terem tocado lado a lado em diferentes grupos, discos, concertos e turnês por quase duas décadas e com o mesmo espírito inventivo e pioneiro que marcou as suas carreiras, Lelo e Zé Eduardo decidiram levar a sua parceria ainda mais fundo. Passaram, então, a se reunir na casa de Zé Eduardo, na Rua Teodoro Sampaio, no bairro de Pinheiros, em São Paulo, no mesmo porão onde engendraram o Grupo Um mais de uma década antes. “A ideia era criar algo novo com uma formação inusitada que nos dava uma vantagem timbrística”, lembra Zé Eduardo. Queriam partir para um trabalho que pudesse ser tocado ao vivo, explorando, de um lado, a riqueza de timbres de teclados e percussão e, de outro, as linguagens de vanguarda. Assim, criaram o Duo Nazario em 1989.

A cumplicidade e a experiência que os músicos vinham acumulando desde meninos somadas à liberdade plena para usar qualquer recurso serviram de plataforma para a criação de um repertório próprio para o Duo, registrado em 1991 no estúdio Cachet, da família Gianullo. Embora esse trabalho não tenha sido lançado à época, parte do material foi usada, anos depois, no CD ZEN, de Zé Eduardo. Também Lelo usou uma das faixas como bônus no seu CD “Se...”.
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Explorando uma formação inusitada e a música erudita contemporânea, Lelo escreveu ainda as composições Limite e Aurora, peças para banda sinfônica, sons eletrônicos e o Duo como solista. Entre 1990 e 1997, o Duo se apresentou, sob a batuta do maestro Roberto Farias, em uma série de concertos com a Banda Sinfônica do Estado de São Paulo, que incluiu a Semana Guiomar Novaes, o Festival de Música Nova e a Bienal de Música Brasileira Contemporânea. As peças também foram apresentadas na Conferência da World Association for Symphonic Bands and Ensembles, na Áustria.

Seguindo a linha experimental e inovadora que caracteriza o trabalho de Lelo e Zé Eduardo, o Duo Nazario aprofunda seu compromisso de trabalhar com as sonoridades e os temas do nosso tempo. “Muitas composições refletem a enorme quantidade de eventos e informações que é gerada no mundo todos os dias, buscando exprimir em sons todos os aspectos dessa entropia crescente e suas consequências para a vida no planeta”, observa Lelo.

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Baseado na combinação de música de vanguarda, jazz, recursos eletrônicos e formas populares, uma sólida base rítmica afro-brasileira e uma grande abertura ao improviso de espírito jazzístico, o Duo desenvolve todo um repertório dedicado a explorar a riqueza de timbres dos sintetizadores e de diferentes instrumentos percussivos. O resultado passa a ser apresentado em shows e festivais, entre os quais se destacam a mostra Brasil Instrumental no Conservatório de Tatuí em 2006, uma temporada no Sesi (interior e capital) em 2011 e concertos no Instrumental Sesc Brasil em 2012 e no Festival Jazz na Fábrica do Sesc Pompeia em 2013.

Com esse trabalho, o Duo é contemplado com o Prêmio Funarte de Música Brasileira 2012 para a produção do CD Amálgama, lançado em 2014. O álbum, que sintetiza uma trajetória de inventividade e maturidade musical, inclui composições apresentadas ao longo de mais de vinte anos, desde temas escritos nos anos 1990 a músicas inéditas criadas em 2012 e 2013.

Com músicos de reconhecido talento e projeção no cenário musical brasileiro e internacional e uma proposta musical que foge aos padrões convencionais, o Duo Nazario se destaca como um representante de ponta na música instrumental produzida no Brasil, diluindo, de uma maneira muito original, as fronteiras entre formas populares, jazz de vanguarda e música erudita moderna e estabelecendo um novo padrão de criação para o gênero: uma música de invenção, brasileira e contemporânea.